terça-feira, 16 de março de 2010

RAPID EYES MOVEMENTS

Sonhei outra vez com vampiros. Com vampiros e o menino de olhos de vidraça na montanha russa. Não sei se essa enchente telecinematográfica que nos invade sem que possamos ao menos fugir ou alienar ou então o que me faz sonhá-los, mas estou incomodado com tudo. O garoto está sempre lá, na fila da montanha russa com seus amigos também amigos meus. Ele tem vidraças no lugar dos olhos, vidraças que transparecem lindos campos de flores coloridas. A paisagem da vidraça é a mesma de sua camiseta, numa estampa aquarelada quase brega quase quase. E ele parece feliz com sua franja caidinha sobre a testa. Fico olhando o garoto. Observando-o. E o pesadelo começa a se delinear. Não consigo entender como alguém pode mutilar-se dessa forma. Tirar os próprios olhos e no lugar instalar duas grandes vidraças quadradas não parece algo certo. E como sorrir assim frouxo sem nunca mais poder ver seu irmão, cachorro, livros, amigos ou que seja um filme ruim no Supercine? Não enxergar o céu nublando depois de um dia abafado, nem os carros ao atravessar a rua? Não, não me parece certo esta estética deturpada. O cosplay extremista ainda ri com os amigos também meus amigos e não me vê. Seu riso parece macabro e me arrepia o corpo todo – imagino que nessa hora meu corpo estivesse todo arrepiado na cama – em calafrios desde a boca do estômago e esôfago acima. E busco não olhá-lo. Temo que me note. E me escondo apavorado. Até que, enfim, subo a montanha russa. O carro parte e passa rápido por túneis rodoviários, escuros das lâmpadas dos postes queimados. As poucas luzes tornam-se flashs e flashs do garoto escabroso que faz me escantear sem ao menos saber que estou lá.

É tamanho o medo que acordo. Acordo em meu quarto penumbrado da tarde amarelada. Mas não é meu quarto, este aqui. É o quarto de quando era pequeno. Minha cama, a cômoda, a cama da mãe, o quadro do anjo da guarda pendurado sobre a cabeceira e os dois homens nus mortos no chão. Acordo dentro do sonho. Levanto-me com uma enxada nas mãos e de repente lembro do ocorrido de antes de dormir que não foi sonhado, mas era como se tivesse sido. Devo enterrá-los no chão do quarto. Quebrar o azulejo, cavoucar e enterrá-los lá. Não quero fazer, pois sei que se tornarão vampiros e me devorarão ao acordar. Sou, contudo, impelido por uma força fora de meu controle. Sinto um olhar me dominar de fora da janela, a minha reveria. Novo arrepio. O rei tirano dos carniceiros me domina. Quer que enterre meus algozes ainda mortos. Fico ali parado. Titubeio. Quero fugir e minhas pernas parecem não buscar o mesmo. Suo. Olho, mas não o encaro. Medo filho da puta.

Sabe-se lá porque, venço a força do vampirão e saio porta afora correndo em um campo bem menos inspirador que o das vidraças do garoto. Um novo flash do garoto. Corro. Corro. Corro até um casebre numa terra não estranha – de um filme, outro sonho ou de alguma chácara talvez. Entro na casa. De dentro percebo as paredes, não há mata-juntas, formando largas frestas.

Acordo novamente. Dessa vez de verdade. Assustado. Está frio. Puxo a coberta e volto a dormir. Novamente a casa. Há outros comigo. Atormentados. Amontoados. Esgueirando as frestas, vigiando o obscuro horripilante. As janelas estão trancadas e pregadas, as portas idem. Entretanto, a falta de mata-juntas nos deixa vulneráveis ao mal que espreita e segue. O medo coletivo transcende em pânico quando no céu surge uma figura pavorosa. Uma vampira medonha, provável cruza da sereia de Manaus com as figuras bruxólicas do Franklin Cascaes. Nesta altura já sei que é sonho e quero acordar. O pavor toma conta. A gargalhada cadavérica regela meus ossos (os de verdade também). Quero acordar. Quero acordar. Acordo. Ufa! Confiro a hora no celular. Ainda não é hora de levantar. Fecho os olhos. A vampira bruxólica. Acordo-assusto. Respiro. Fecho os olhos. O garoto dos olhos de vidraça. O vampirão me fuzilando. Acordo. Falta meia hora. Melhor esperar acordado. E viro de lado – parece estranho e sem nexo, mas o que que eu posso fazer?, foi isso assim que aconteceu.

Um comentário:

Mamãe Fê disse...

Te indiquei prá um 'selinho' no blog... dá uma olhada lá no meu. Bjuuuu!!!

SIGAM-ME OS BONS!